3.7.12

(des) Comendo Chocolate - uma história longa, longuíssima

Já dizia a minha professora de filosofia "Comam chocolate! O chocolate tem uma substância que liberta no corpo humano hormonas que nos dão a sensação de felicidade."
Afogada nas almofadas em pele de ovelha da minha cama (ainda) lilás delicio um chocolate pensativo. A pergunta que nunca tinha feito, fazia-a agora, nas bancadas da cozinha, perto da uma da manhã.
- Mãe, posso te fazer uma pergunta?
Silêncio...
- É só uma? Duvido...
Silêncio...
- Posso?
- Sou toda ouvidos!
Encarando-a frente a frente:
- Mãe, se eu te pedisse para mudar de escola, tu deixavas?
Esperei que a cara dela mudasse de cor, não mudou. E sem meditar por um ínfimo instante, não hesitou, e disse:
- Não!
Julgando-a incompreensível, serenamente apenas perguntei:
- Podes explicar-me porquê?
A partir daí acabaram-se as respostas diretas. Ela nunca me respondeu a esta pergunta diretamente, alegando um motivo justo. Mudou de assunto, respondeu com outras perguntas, quis saber motivos e insistir em pontos errados. Depois de ter retorquido com mil e uma respostas erradas, eu percebi que não me levaria a lado algum. Abandonei-a. A conversa estava acabada. Dirigi-me ao meu quarto, fechei a porta suavemente como quem diz "Boa-Noite Mãe" e atirei-me para cima da cama. A voz tremia-me sem saber porquê e ela abre a porta suavemente e senta-se ao meu lado.
- Que se passa?
Fitando o meu edredão "ovelha" de cor lilás, com o telemóvel entre dedos, nunca percebendo o que estava realmente a fazer, continuei em silêncio. E mantendo-me imóvel:
- Eu não gosto das pessoas de lá. São emproadas, "desadequadas", invejosas e mimadas. Com atitudes próprias de pessoas ricas que têm o que querem, à hora que querem. Exibem suas roupas de marca e tentam rebaixar os outros com comentários insultuosos. Sou "obrigada" a conviver com contrastes de pessoas que, a mim, só me causam repulsa de tão fúteis que parecem. Pessoas sem carácter que não sabem o que é viver e partilhar. Pessoas que se perderam em dinheiro. Quero ir para uma escola pública.
Pausa...
- Fizeram-te alguma coisa? Insultaram-te? Maltrataram-te?
Eu pensava "Sim! Também..." , mas na realidade apenas calava.
- Diz-me, eu preciso de saber...
(...)
- Mãe... Se a tua opinião não vai mudar (por mais motivos que tenhas para a mudares) não adianta remexer em histórias passadas.
- Roubaram-te o namorado?
("Primeiro, era preciso haver um!")
- Oh mãe, não tem nada a ver. Até porque naquela porcaria de escola é impossível arranjar alguém!
- Pois... Tiveste alguma negativa?
- Claro que não! É claro que o ensino é mais exigente e sei que poderia ter melhores notas noutro lugar. Mas eu não vim para Humanidades para andar com 15, 16 e 17. Esperava ter melhor...
- Se calhar tens de estudar mais...
- Sabes bem que estudo.
- Já estás ali há 6 anos, não custa nada mais um pouco.
(...)
- Se me dissesses o que se passa, talvez até resolvesse a tua situação... Dorme bem, descansa a cabeça. Aguenta mais um pouco e estuda...
Senti-a levantar-se e apagar a luz à sua saída. Mas, como sempre, deixando a porta aberta. Levantei-me, com uma lágrima no canto do olho fechei a porta, desfiz a cama e abracei as almofadas. Do lado de lá, ouvi-a lavar os dentes.
Refletindo sobre o assunto: "Ela apenas quer manter-me longe do que acha que me pode fazer mal. Mas realmente, já estou cansada de viver nesta bolha. É mais perto, mais barato e fazer-me ia feliz. O que pode dar errado? O ensino é mais fácil, poderia ter melhores médias. As pessoas que eu conheço que saíram daquela escola, melhoraram médias."
Vibra o telemóvel, "mensagem nova", da P: "Vou mudar de escola." Uma das minhas melhores amigas e o meu único suporte estava a ir-se embora. "Pronto, era só o que faltava". Mesmo já tendo desconfiado, não pensei ser certa a sua decisão. "Vem comigo!" Ironicamente pensava "Se conseguisse..." Liguei-lhe:
- Não posso ir. A minha mãe não deixa.
- Porquê?
Sem ter resposta certa disse-lhe:
- Não sei ao certo. Só sei que não me deixa.
(...)
Agora, afundada nas almofadas comendo chocolate penso se não foram as pessoas de padrão "aceitável" que me recriminaram por não ter o peso ideal, se não serão elas as responsáveis por me encontrar "emocionalmente não disponível", ou por ter barreiras daquilo que sou fisicamente, tanto em tamanho, como em descendências. Fora daquelas barras consegui encontrar tantas coisas que seriam de modo algum possíveis lá dentro. Sentirei imensa falta da P. Desistirei de tudo. Estarei lá apenas para estudar. Nada mais me prende àquele lugar.
Acabo de comer o chocolate que provavelmente vomitarei depois de desligar o computador.

PS.: Não me deu sensação nenhuma de felicidade, não hoje.

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